Eu era viciada em refrigerante, agora completo 10 anos sem beber

Stephanie D'Ornelas
5 min readSep 13, 2020

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Foto: Pexels/Reprodução

Esses dias constatei que já faz mais de uma década que eu não tomo Coca-Cola, Pepsi, Fanta… ou qualquer outro tipo de refrigerante. Tudo começou com uma promessa: caso eu passasse no vestibular da Universidade Federal do Paraná (UFPR) — lá em 2010 — eu ficaria um ano sem tomar refri. Isso me parecia uma tarefa hercúlea, porque eu realmente era viciada nessas bebidas coloridas extremamente doces e gasosas. Um almoço com um copo de guaraná gelado era um almoço feliz.

Tão difícil quanto isso parecia ser passar no curso que eu queria na UFPR (naquela época, eram 17 candidatos concorrendo por uma vaga do curso de jornalismo). Depois de um ano insano de estudos, em que minha realidade era ficar na companhia das apostilas do cursinho de segunda a segunda, eu acabei conseguindo uma vaga em uma das chamadas complementares. Tempos depois lembrei da promessa… era o momento de abdicar do meu prazer açucarado.

Eu tinha 17 anos e lembro do peso na minha consciência quando, depois de ter decidido cumprir com o prometido, falhei por três vezes. Lembro até hoje dessas decaídas. No aniversário de uma prima, quando não deu pra dizer não para a garrafa de Coca me olhando, ao lado dos salgadinhos de festa; em um churrasco em que a vida parecia não fazer sentido sem a bebida; e em um almoço em que não resisti a um copo de Kuat, que era meu refrigerante preferido.

A culpa que sentia por ter “falhado comigo mesma” era tanta que me comprometi de maneira definitiva: a partir dali, se não houvesse outra opção, eu beberia água (com 17 anos eu ainda não gostava de cerveja, então essa também não era uma alternativa). No início, cada copo de água parecia deixar os dias cinzas. Antes da promessa, eu era capaz de tomar refrigerante todos os dias, independente das consequências. E foi só quando eu decidi dar um basta que percebi como seria difícil largar o vício.

Pesquisas indicam que você pode criar um novo hábito repetindo uma mesma atividade por 21 dias. Eu não sei bem em que momento não tomar refrigerante se tornou o padrão natural para o meu corpo, mas depois de um tempo eu simplesmente parei de sentir qualquer vontade de beber. Se você for uma pessoa viciada em Coca como eu era, é fácil entender por que é tão difícil largar: os refrigerantes foram criados em uma lógica que tem como objetivo viciar o seu corpo.

Fórmula do prazer

Uma série de fatores faz com que os refrigerantes sejam tão viciantes. De acordo com esta matéria da CNN, Gary Wenk, diretor dos programas de graduação em neurociência da Universidade Estadual de Ohio e autor do livro “Your Brain on Food”, diz que está tudo no design da bebida, que é elaborada com a quantidade certa de adoçantes, cafeína e carbonatação para que você não queira parar de beber.

Uma lata de 350 ml de Coca-Cola tem 37 gramas de açúcar, o que equivale a 7 colheres e meia de chá (5 gramas cada). Essa explosão doce parece ativar os mesmos centros de recompensa no cérebro que as drogas, de acordo com Wenk. Junto à liberação de dopamina, vem a sensação de euforia. Mas o efeito da dopamina desaparece tão rápido quanto sua chegada, deixando o cérebro com vontade de mais.

Junto com o açúcar, temos a cafeína, um dos psicoestimulantes mais consumidos no mundo. A cafeína não só acelera nossos pensamentos, mas também tem uma capacidade única de ativar as vias de recompensa que envolvem a dopamina, de acordo com Wenk. Esse estimulante é viciante, como você já deve ter percebido se for um bebedor assíduo de café.

Muita gente que consome cafeína regularmente começa a depender dela para aumentar a capacidade de atenção e se sentir com energia. Podem surgir até sinais de abstinência quando essas pessoas param de consumir abruptamente, como dores de cabeça e falta de concentração (no meu caso, um dia sem café é dor de cabeça na certa).

Outro elemento que desempenha papel significativo na dependência do refrigerante é a efervescência. Afinal, uma Coca-Cola sem gás não é tão atraente do que uma que você acabou de abrir e está geladinha, não é mesmo? Segundo Wenk, as bolhas adicionam uma pequena quantidade de acidez à bebida, que, combinada com o açúcar, intensifica a sensação de euforia. Além disso, o gás atenua o sabor dos adoçantes, tornando o gosto da bebida apenas doce o suficiente para que você não enjoe dela.

Dito tudo isso e voltando a minha experiência pessoal: no início foi realmente difícil ficar sem beber refrigerante, mas depois de um mês eu já não sentia mais a necessidade de beber. Sim, era mais do que vontade, eu sentia quase que uma necessidade física. Com o passar do tempo, comecei a enxergar o refrigerante de forma racional: uma bebida com tudo o que meu corpo não precisa. Muito açúcar, quantidades absurdas de sódio, corantes e conservantes, além de vários outros “antes” e ingredientes impronunciáveis.

A minha promessa de ficar um ano sem beber refrigerante acabou, mas eu não tinha nenhum motivo pra retomar ao vício. Mais de dez anos se passaram agora, e neste período passei por outras mudanças em busca de uma alimentação mais saudável: parei de comer carne há seis anos, prefiro sempre alimentos frescos aos industrializados, evito consumir quantidades exageradas de sal ou açúcar.

Eu não sou a pessoa mais saudável do mundo, estou longe de fazer a quantidade de exercícios físicos que eu gostaria, por exemplo, e tem dias que nada me fará mais feliz do que comer pizza e batata-frita (e não há absolutamente nada de errado nisso). Mas essas mudanças de hábitos que parecem tão simples, como parar de beber refrigerante — ou pelo menos reduzir o consumo — fazem bastante diferença na saúde e na qualidade de vida.

Se você quer largar o refrigerante também, minha experiência diz que será necessária muita força de vontade nos primeiros dias (ou meses) longe da bebida, mas depois que você superar este período em que seu corpo irá implorar para você cair em tentação, tudo vai ficar mais fácil e você nem vai lembrar mais do porque gostava tanto dessas bebidas industrializadas.

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