Isso também vai passar
Lembrei de um dia ensolarado, acho que era fevereiro, eu sempre ia e voltava da terapia de Uber quando eu trabalhava longe da clínica onde minha psicóloga atendia, correndo pra dar tempo de fazer o atendimento na hora de almoço, mas agora eu estava trabalhando perto de casa, só de manhã, e podia fazer a sessão à tarde e voltar à pé e sem pressa. Eu tinha mais tempo e estava empolgada com as possibilidades das horas livres.
Andava reparando nas casas daquele bairro que era — ainda é — novo para mim. Feliz pelo sol me aquecendo e por ter toda uma tarde livre pela frente. Eu podia ter virado antes, mas resolvi ir até à praça, passar no mercado, comprar uma água com gás — uma pequena alegria nos dias de calor, como a sensação de quem toma Coca-Cola gelada, mas eu já não tomo refrigerante há muitos anos e me viciei na sensação das bolhas da água gaseificado descendo pela garganta.
Com a sacola na mão e tranquila, eu vejo as plantas que formam um tapete verde na lateral da praça, sempre ficava reparando naquelas plantas que pareciam tão resistentes ali, eu me desvio da pessoa que passeia com os cachorros e da outra fazendo caminhada. Eu paro, eu espero os carros passarem, atravesso. Eu estou chegando em casa. Finalmente, porque está tão calor. Eu aproveito a tarde que é totalmente minha. Eu já trabalhei, eu me sinto leve depois da terapia, eu não tenho aula à noite.
Agora estou no mesmo lugar, e está tudo bem. Eu estou em casa, eu continuo trabalhando e até fazendo terapia, só está tudo diferente. Não há caminhadas para lugar algum, não há desvios no trajeto, nem cachorros, nem ir ao mercado apenas para comprar uma garrafa de água. Eu sinto falta das pequenas surpresas da vida lá fora.