Políticas do design — um guia (não tão) global de comunicação visual

Reflexões sobre o livro de Ruben Pater, publicado no Brasil pela Ubu Editora

Stephanie D'Ornelas
3 min readJan 27, 2021
Foto: Stephanie D’Ornelas

Quando eu comecei a faculdade de Design Gráfico, no início de 2019, eu tinha uma visão bem limitada do que era o design. Sinto que eu ainda estou descobrindo o que ele é, já que é tantas coisas ao mesmo tempo e estou sempre aprendendo facetas novas dentro desse campo. Uma das muitas coisas que o design é, é política. Agora isso é muito claro para mim, mas quando tive as primeiras aulas em que professores falavam sobre como o design assume papeis sociais e políticos, me senti o próprio meme da cabeça explodindo. O design, como tudo produzido pelos seres humanos, não é neutro: ele é reflexo da sociedade em que está inserido.

O livro Políticas do design — um guia (não tão) global de comunicação visual, do designer holandês Ruben Pater, é um bom ponto de partida para quem quer entender como os elementos clássicos do design gráfico — como tipografia, cores, fotografia, símbolos e infográficos — refletem o contexto cultural, social e político. Em um mundo imerso por imagens, naturalizamos a utilização desses elementos, mas nada é “apenas” um ícone, uma fonte, uma imagem. Tudo é construção.

Um exemplo sobre a não-neutralidade do design é como nas universidades brasileiras o design ensinado, criado e discutido costuma ser tudo menos brasileiro ou latino-americano: é um design eurocêntrico, que mesmo aplicado em contextos completamente distintos dos europeus é muitas vezes reproduzido sem grande reflexão ou contestação. Isso não é uma questão brasileira apenas, é claro: acontece em vários outros países que foram colonizados pelo globo. O próprio Ruben Pater, como europeu, fala na introdução do livro sobre como ele tem uma visão recortada do mundo a partir de suas vivências e origem, e tentou corrigir alguns de seus pontos-cegos com a ajuda de coautores de diferentes partes do planeta.

Sou um autor privilegiado. Nasci na Holanda, um país no qual a cultura do design é financiada pelo Estado. Durante meus quinze anos atuando na área, trabalhei com publicidade, para governos, em instituições culturais e com ativismo político. Aprendi que há muitas formas de comunicação visual, e nenhuma delas é desprovida de ideologia. (Ruben Pater)

Por que rosa é cor de menina e azul, de menino? O que as cores representam em diferentes culturas? Como a escolha de cores em objetos com “cor de pele” (que pele?) reforçam o racismo? Algumas das reflexões e debates que estão presentes no livro. Foto: Ubu/Reprodução

Políticas do design é mais do que um livro: é uma espécie de cartilha, como definiu o jornalista Bruno Torturra no texto que acompanha a contracapa. Ou um guia, como indica o subtítulo da obra. Um “beabá” para designers e não-designers que esmiúça — a partir de dezenas de exemplos— como cada escolha de design têm um significado. Precisamos ter consciência disso se quisermos fazer escolhas que não sejam mera repetição de um padrão que pode reforçar preconceitos, opressões, apagamentos e exclusão de grupos sociais.

Um simples ícone pode ser criado em cima de preconceito e estereótipos. Foto: Ubu/Reprodução

O livro, publicado aqui no Brasil pela Ubu Editora, é uma leitura leve com um texto bem didático, dividido em vários pequenos artigos sobre cada assunto. Recomendo para todos que estudam ou trabalham com design, mas também para pessoas de quaisquer outras áreas que se interessem pelo tema e que tenham curiosidade de entender porque os elementos gráficos são da maneira que são — da cor de uma bandeira até os tipos de mapa-múndi que usamos para representar o globo. Você pode ler um trecho inicial do livro aqui.

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Written by Stephanie D'Ornelas

brazilian journalist writing about books, art, cinema and more | jornalista curiosa sobre o mundo. aqui escrevo sobre livros, arte, filmes e devaneios

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